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To-To-To! e Tora, Tora, Tora!


Tora, Tora, Tora!

por Gordon W. Prange

Foi uma das cartadas mais perigosas da história, com uma quase impossível possibilidade de sucesso. Até 7 de dezembro de 1941, Pearl Harbor, "Gibraltar do Pacífico" da América, era por muitos considerada a base naval mais bem defendida do mundo. Para atacá-la o Japão reuniu uma armada de 31 vasos de guerra - inclusive 6 grandes porta-aviões e 353 aviões - e enviou-a às ocultas através de milhares de milhas de oceano. A traiçoeira missão, planejada no mais absoluto segredo, foi levada a efeito com a mais completa e assombrosa surpresa, e sem um arranhão em nenhum dos vasos da armada. Até a publicação deste livro, o relato completo do planejamento de execução dessa fantástica proeza era um dos grandes dramas ainda por narrar na Segunda Guerra Mundial.

Três submarinos cortaram velozmente as águas negras do oceano, 100 milhas na dianteira do grosso dos navios. Deslizando rente à superfície, os submarinos mantinham-se alertas ao menor indício de interceptação. Atrás deles, avançavam em ondas de espuma os destróieres, cruzadores, vasos de guerra e porta-aviões que compunham a esquadra de ataque - uma formação maciça estendendo-se pelo mar numa área tão grande quanto a distância entre o Rio de Janeiro e Campos, no Estado do Rio. Entretanto, essa imensa esquadra se perdia nos ilimitados confins do Pacífico. De seu porto de partida, navegava despercebida por quase 3.500 milhas.

No convés de aterragem dos porta-aviões, bombardeiros e caças estavam alinhados em posição de levantar voo, seus narizes apontados para as proas, como se ansiosos para decolar. Os mecânicos de aviação, como soturnos gnomos na obscuridade lúgubre, corriam de um lado para outro, dando uma última vistoria em motores, rádios, trens de aterrissagem e tanques de combustível. As caixas de munição das metralhadoras estavam cheias, e as bombas e torpedos em seus compartimentos. Um dos mecânicos sorriu para si mesmo, ao deparar-se com uma mensagem escrita a giz no lado de uma bomba: "Esta vai começar a guerra com a América".

Pois era esta a I Frota Aérea da Marinha Imperial Japonesa, com a missão de desfechar um ataque de surpresa sobre Pearl Harbor - um ato de absoluta perfídia por parte dos japoneses - uma cartada militar fantástica, na qual uma nação em desespero resolvera apostar seu futuro.

Nas horas que antecederam a madrugada de 07/12/1941, a atmosfera a bordo dos vasos de guerra japoneses era sinistra. Os pilotos veteranos, os que tinham centenas de horas de voo, sentiam mais antecipação tensa do que medo. Mas, para os oficiais jovens que mal tinham completado seu treinamento, a excitação misturava-se a um terror frio. Os aviadores inexperientes dos porta-aviões Shokaku e Zuikaku, recém-saídos dos estaleiros, pareciam especialmente nervosos ao engolirem sua refeição antes do combate, composta de chá verde e bolinhos de arroz e sentiam a comida coagular-lhes no estômago. Depois das instruções finais, muitos dos pilotos se detiveram ante uma miniatura do altar xintoísta, para curvar-se em prece silenciosa. Outros despediram-se de amigos e companheiros entre as tripulações dos navios

E não eram só os oficiais subalternos que se sentiam inquietos. O próprio Comandante-em-Chefe da expedição, Almirante Chuichi Nagumo, passara a viagem toda andando de um lado para outro de sua cabine, numa ansiedade que não o deixava dormir, pois estava convencido desde o começo que a missão estava fadada ao fracasso. O Comandante Minoru Genda, encarregado das operações aéreas, sentiu-se esmagado pela responsabilidade que lhe fora confiada. Normalmente imune a preocupações, nas últimas horas do ataque ele se pusera a pensar no perigo de ciladas imprevisíveis. Aquele dia poderia trazer uma vitória gloriosa ou - queiram os deuses ancestrais que não! - uma estrondosa derrota. Genda refletia que das suas decisões dependia o futuro de 100 milhões de compatriotas seus.

O plano de atacar Pearl Harbor havia sido concebido e impelido contra qualquer oposição pelo Comandante-em-Chefe da Esquadra Combinada Japonesa, Almirante Isoroku Yamamoto. Havia uma ironia nessa circunstância, pois Yamamoto era um estrategista brilhante, que se opunha frontalmente à guerra com os Estados Unidos. Tinha tido ocasião de ver por si só o poderio industrial da América, quando estudante em Harvard e, mais tarde, como Adido Naval em Washington. Mas Yamamoto era um nacionalista convicto e um japonês até a medula dos ossos. Seu amor pelo Imperador e pela pátria era vulcânico, e seu coração de guerreiro seguia as tradições do verdadeiro samurai... o dever acima de tudo. Yamamoto acreditava, como a maioria das pessoas no Japão naquela época, que os japoneses eram uma raça eleita, escolhida pela sábia Providência para cumprir um destino inelutável. Assim, com essa maneira de pensar, era lógico que o Japão desempenhasse um papel dominante na comunidade das nações asiáticas.

Muito tempo os japoneses sonhavam como desenvolver seu Império explorando os recursos das ricas terras do Sul - as Filipinas, a Malásia e as Índias Orientais holandesas. Mas para que a operação fosse bem-sucedida, a Marinha Americana teria que ser barrada nos mares do Sul, pelo menos durante os primeiros meses críticos. Como conseguir isso? A solução de Yamamoto para o problema estava condicionado tanto à sua educação como a seu temperamento. Ele era técnico em aviação, suas ideias eram originais e arrojadas, e a sua natureza a de um jogador. Gostava de citar máximas para reforçar o que dizia, e uma de suas prediletas era: "Quando se quer filhotes de tigre é preciso ir buscá-los no covil do tigre". Inevitavelmente, seus olhos estavam voltados para o covil do tigre em Pearl Harbor, Havaí - base da Esquadra Americana no Pacífico. Seria possível destruir essa esquadra antes de se iniciar o ataque às regiões do Sul?

Um dia, em janeiro de 1941, e Yamamoto retirou-se para sua cabine no navio-capitania Nagato e escreveu a seu grande amigo, Almirante Takijiro Onishi, que era um dos poucos almirantes entendidos em aviação na Marinha Japonesa. Advertindo Onishi de que o assunto era o de absoluto segredo, ele delineou numa rápida carta de 3 páginas o plano de um ataque aéreo de surpresa sobre Pearl Harbor. Achava Onishi que tal ataque era inexequível? Por favor, estude cuidadosamente os problemas relacionados ao plano" pedia Yamamoto.

Uma das primeiras providências do Almirante Onishi foi mandar chamar o Comandante Minoru Genda, de 36 anos, o oficial de aviação no porta-aviões Kaga. Dificilmente ele poderia ter tomado uma providência mais dinâmica. Genda era o aviador mais brilhante da Marinha Imperial. A sua aristocrática fisionomia de falcão, com sobrancelhas espessas, nariz reto e queixo firme, era dominada por olhos pretos de intensidade quase assustadora. Suas ideias eram arrojadas e imaginativas, que ele já tiveram grande influência nas táticas e planejamentos da aviação da Marinha.

Quando Onishi lhe mostrou a carta de Yamamoto, Genda leu-a pensativamente. A audácia e originalidade da ideia de Yamamoto imediatamente o atraiu. "O plano é difícil, porém não impossível", disse ele. A mira principal, na sua opinião, devia ser os porta-aviões americanos, pois eram esses que ofereciam o maior perigo à Marinha Japonesa.

Genda retornou ao Kaga fervilhando de ideias. Na quietude de sua cabine, pôs-se imediatamente ao trabalho. Duas semanas depois, entregava a Onishi um traçado completo do ataque projetado. A seu ver, de certo deviam participar todos os porta-aviões disponíveis, e o ataque deveria ser despachado por volta da madrugada, a fim de que a aproximação se processasse em grande parte sob a proteção da obscuridade. A parte de aviação devia incluir bombardeiros de mergulho, bombardeiros de voo alto, aviões-torpedeiros e caças.

Onishi aprovou quase todas as sugestões engendradas e acrescentou algumas suas; o projeto que remeteu à Yamamoto em princípio de março era essencialmente o plano que foi utilizado. Dentro de um mês estava sendo implementado, quando um conceito estratégico, há muito criticado pelos aviadores da marinha foi adotado. Cinco porta-aviões, então destacados para forças separadas, foram reunidos com 10 destróieres, 2 para cada porta-aviões, a fim de formar a Primeira Frota Aérea. A medida sofreu uma violenta oposição dos "almirantes de couraçados", que nada sabiam do plano de Pearl Harbor (e não o teriam aprovado se o soubessem). Mas Yamamoto seguiu em frente e dali em diante Genda acompanhou a operação como um possesso, vivendo cada dia com a intensidade religiosa de um monge.

Yamamoto gostaria imensamente de chefiar ele próprio a nova esquadra, mas, como fosse indispensável onde se achava, o posto coube ao Vice-Almirante Chuichi Nagumo, mais por uma questão de hierarquia. Nagumo, um marujo à moda antiga que não era muito imaginativo, era reconhecidamente uma autoridade em navegação e manobras navais. Todavia, em ocasião alguma de sua longa e honrosa carreira tivera ele o menor contato com aviação e, quando o informaram a respeito do plano de Pearl Harbor, ficou aterrorizado.

Mas, por enquanto, o fleumático Nagumo se reconfortou com a suposição de que um plano tão temerário tinha pouca possibilidade de ser executado. Prosseguiam ainda as negociações com Washington. (Com calculada duplicidade, o Japão continuou as conversações até o exato momento em que as primeiras bombas foram lançadas). Nagumo achava que a guerra com os Estados Unidos não era em absoluto inevitável. E, também, Yamamoto recebera sua autoridade iniciando tal plano; a função de planejamento pertencia ao Estado-Maior Naval. A não ser que aquele órgão aprovasse o projeto de Yamamoto - o que Nagumo considerava improvável - a ideia estava fadada a ficar enterrada nos arquivos secretos.

Apesar das esperanças de Nagumo, continuava a inexorável marcha para a guerra. Em 25 de julho de 1941, o Japão e estabeleceu um "protetorado" sobre a Indochina francesa, e elementos da sua "Nova Ordem", que já ocupavam o Norte do país, num rápido avanço tomaram conta do resto. No dia seguinte, o presidente Franklin Delano Roosevelt congelou todos os bens japoneses nos Estados Unidos; proibiu a navios japoneses carregar ou descarregar em qualquer porto americano; e, já tendo cessado, desde o outono anterior, embarques de ferro e sucata, passou ao proibir também a venda de petróleo americano no Japão. A Inglaterra e a Holanda tomaram medidas semelhantes.

"A guerra econômica já foi declarada", disse um jornal japonês. "Não é difícil imaginar o que virá em seguida."

Em 6 de setembro, o Imperador Hirohito reuniu os dirigentes do Japão para um grave balanço da situação. Sentaram-se ao redor de uma comprida mesa retangular na Sala Leste no. 1 do Palácio Imperial, instalando-se o Imperador restrito à cabeceira da mesa. Sua Majestade manteve-se imóvel e aparentemente impassível enquanto o primeiro-ministro Fumimaro Konoye abria a conferência com a leitura de um "Plano Geral para a Política Nacional", revelando que:

1. O Império estava resolvido a arriscar a guerra com os Estados Unidos, Grã-Bretanha e Holanda, a fim de atingir seus objetivos econômicos no Sul do Pacífico. Os preparativos de guerra deviam estar terminados em fins de outubro.

2. Até aquela data provisória do rompimento, o Império tentaria obter suas reivindicações através de negociações.

O mínimo de exigências do país, entretanto, condenava ao fracasso as negociações, pois a sua obtenção garantiria para o Japão um poderoso império, ao passo que deixaria os Estados Unidos e a Grã-Bretanha virtualmente de mãos atadas no Extremo Oriente.

Um por um, os vários dirigentes levantaram e discutiram a situação. Todos frisaram a necessidade de urgência. Circunstâncias econômicas prementes estavam fazendo com que o Japão se enfraquecesse em vez de tornar-se mais forte. Era preciso agir enquanto ainda havia estoques de materiais básicos, já que a hostilidade britânica e o embargo dos Estados Unidos impossibilitavam a renovação desses estoques. O General Teiichi Suzuki, por exemplo, chamou a atenção para o fato de que restava pouco mais de um ano de abastecimento de petróleo. Se o Japão não agisse logo, não poderia mais de forma alguma agir.

O último a falar foi o porta-voz do Imperador, Barão Yoshimichi Hara. O plano de política nacional preocupava-o, disse ele (falando pelo Imperador). "O plano proposto deixava a impressão de que dera primazia à guerra, relegando a diplomacia para considerações secundárias. Estarei certo em presumir que tudo o que é possível está sendo feita para salvar a situação por meios diplomáticos?". Houve um silêncio breve. E então o Almirante Koshiro Oikawa, Ministro da Marinha, apressou-se em garantir que era esse o caso. Mas parece não ter sido tão convincente.

Em seguida, para o espanto de todos, o próprio Imperador levantou-se para falar aos presentes. Nunca antes Hirohito usara pessoalmente da palavra numa Conferência Imperial. Mas agora, ali estava de pé, o símbolo vivo do Império, o 124º. Imperador do Japão, radiando seu "divino fulgor".

Tirou do bolso um poema intitulado "Os Quatro Lados do Mar", escrito por seu avô, o Imperador Meiji. Com todos os membros da conferência mal ousando respirar, Hirohito leu com profunda gravidade o poema em voz alta:

"Para mim, todos os povos do mundo são irmãos.
Então, por que as ondas e os ventos estão hoje tão agitados"?

O Imperador disse a seus ouvintes que relera muitas vezes o poema. Por que não era possível aplicar ao presente o ideal de seu avô, de paz internacional? Seguiu-se um silêncio tenso, até que finalmente o Chefe do Estado-Maior Naval respondeu que certamente o Comando Supremo reconhecia a importância da diplomacia; recomendava a força armada só em última instância. O Chefe do Estado-Maior do Exército ecoou essa opinião, mas o Imperador estava longe de se satisfazer. A conferência foi adiada, segundo escreveu o Primeiro-Ministro Konoye, "numa a atmosfera de tensão sem precedente".

Os americanos que acreditam que o Imperador poderia ter evitado o plano de Pearl Harbor se desejasse, ou se fosse de um caráter mais firme, não compreendem a posição sutil e complexa do Imperador e o sistema de vida japonês. Ele só podia aconselhar, advertir - e ratificar. Pois o Imperador deve ser uníssono com seu governo para preservar a unidade monolítica da nação. Ele estava amarrado ao mastro de seu próprio prestígio ilimitado. Nessa conjuntura, entretanto, o Imperador Hirohito não sabia sequer do projeto do ataque a Pearl Harbor.

Não se deve supor que houvesse apoio unânime ao ousado plano de Yamamoto. Com efeito, quase nenhum dos oficiais superiores da marinha o aprovava. Alguns críticos julgavam o esquema todo injustificadamente audacioso. Outros, com os olhos postos na Operação-Sul, achavam que o plano teria esgotado até os limites os recursos navais do Japão. Por fim, os almirantes de couraçados e estavam sinceramente convencidos de que era um erro contar com navios tão pouco blindados como porta-aviões. Mas esses conservadores tinham em Yamamoto um oponente de uma força extraordinária.

Uma fotografia de Yamamoto, batida no auge do seu poder, revela um homem de estatura baixa até para um japonês - 1 m 58 cm de altura. - Os ombros largos eram acentuados por maciças dragonas, e um peito empinado recoberto de medalhas e ordens. O efeito seria cômico, não fosse pela fisionomia. De lábios grossos, nariz reto e olhos grandes, com cabelo grisalho cortado rente, à escovinha, é o rosto de um homem de ação, de imensa força de vontade.

Na juventude, sua devoção pelos estudos fora fanática. Para concentrar-se com mais intensidade ia despindo sucessivas peças de roupa na esperança de que o frio afastasse o cansaço. Em muitas noites gélidas, seus pais o encontraram quase nu em seu quartinho, estudando álgebra ou algum livro de geometria.

Agora, ao saber das "conversinhas" contra Pearl Harbor, Yamamoto, em 11 de outubro, mandou chamar a bordo do couraçado Nagato cerca de 50 dos seus comandantes de frota. Um por um, vários almirantes externaram suas dúvidas. O tempo era cada vez mais perigosamente exíguo para operações no Norte do Pacífico. O mar grosso e o mau tempo tornariam impossível o reabastecimento de combustível. Além do mais, não se podia descuidar da Rússia soviética. Até mesmo o almirante Onishi, a quem Yamamoto confiara em janeiro o seu plano, agora achava-o pouco prudente com as forças aéreas de porta-aviões de que dispunham.

O último rubor do poente já quase desaparecera no horizonte quando Yamamoto se levantou. Começou devagar, porém com uma indubitavelmente determinação. Anotara as questões aventadas, disse ele, que seriam levadas em consideração. Mas estiverem estudando por muito tempo toda situação estratégica. A operação contra o Havaí era essencial à estratégia do Japão. Sem isso, a operação no Sul fracassaria. Portanto, ele queria que uma coisa ficasse bem clara: "Enquanto eu for Comandante-em-Chefe da Esquadra Combinada, Pearl Harbor será atacada". A declaração esclareceu tudo de uma vez por todas. Todos os comandantes da frota compreenderam que dali por diante não haveria mais desentendimentos nem queixas. Se o Japão entrasse na luta, a esquadra iria para a guerra com a exultante unidade de uma grande cruzada.

Mas o Estado-Maior da Marinha continuava irredutivelmente contra Pearl Harbor, e ali o problema era mais complexo, já que Yamamoto estava lidando com o pináculo da hierarquia naval. Todavia, era o almirante um bom jogador de pôquer. Em fins de outubro, ele decidiu enviar um emissário ao Estado-Maior Naval para um acerto de contas. Escolheu o oficial mais categorizado do seu Estado-Maior, o Capitão Kameto Kuroshima, para a tarefa, e armou-o com uma última arma audaciosa, se tudo mais falhasse.

Kuroshima foi diretamente ao Capitão Sadatoshi Tomioka, o eficiente chefe da Seção de Operações do Estado-Maior Naval e não perdeu tempo com cortesias.

"O Almirante Yamamoto insiste em que seu plano seja adotado", disse Kuroshima. "Autorizou-me a declarar que, caso não o seja, ele não mais será responsável pela segurança do Império. Não lhe restará, nem a todos seu Estado-Maior, senão a alternativa de demitir-se".

Os olhos de Tomioka se arregalaram e ele ficou boquiaberto. A importância da ameaça impressionou-o profundamente. Ainda assim, só concordou com o ataque no que referia à sua opinião pessoal - e Kuroshima teve que enfrentar o próximo oficial em hierarquia. Mais uma vez, lançou mão da ameaça de Yamamoto, e, finalmente, o Estado-Maior Naval, agindo em conjunto, sancionou o ataque a Pearl Harbor. Era uma grande vitória, que mais a posição e a influência de Yamamoto na marinha japonesa eram excepcionais. Não ocorreu sequer a nenhum dos membros do Estado-Maior Naval entrar na guerra sem Yamamoto no leme da esquadra combinada. "Era inconcebível", disse mais tarde um dos almirantes.

Desse momento em diante, a espionagem japonesa no Havaí recrudesceu. Pearl Harbor foi dividida em 5 áreas que, sob a designação de A, B, C, D, E, e já não mais bastavam os informes regulares sobre quais os vasos de guerra americano estavam no porto. Em vez, Tóquio agora tinha que saber exatamente onde cada navio se achava ancorado, e eram feitas inúmeras perguntas sobre patrulhas aéreas e formação de aviões. Em grande parte, esses dados podiam ser obtidos por meios legais, e bastava olhar. Certos membros do consulado japonês em Honolulu desempenhavam-se com eficiência dessa tarefa, sendo que o mais atuante era um jovem funcionário que dizia chamar-se Tadashi Morimura. Seu verdadeiro nome, no entanto, era Takeo Yoshikawa, e ele fora um guarda-marinha na Marinha Imperial.

Quando Yoshikawa chegou ao Havaí, em 28/03/1941, apresentou-se ao cônsul-geral Nagao Kita, um diplomata de carreira recentemente transferido para Honolulu para trabalhar com ele. Examinando com interesse seu novo subordinado, Kita viu na sua frente um esguio e bonito rapaz de estatura média, parecendo bem mais moço do que os seus 29 anos e tem nada se assemelhando a um espião experimentado. Com efeito, a impressão que dava era de um ingênuo, do tipo que homens mais velhos chamam "meu filho", senhoras cercam de cuidados, e por quem mocinhas se interessavam. Ele não tinha experiência anterior como agente secreto, e além do mais perdera a primeira falange do dedo indicador da mão esquerda - uma deformação que poderia denunciar-lhe a sua identidade. Kita teve sérias dúvidas se Yoshikawa era o homem indicado para a tarefa.

Mas Tóquio não cometia erros em tais questões. A própria falta de experiência de Yoshikawa era uma vantagem, pois seu nome nunca tinha figurado numa lista de adidos para despertar a curiosidade das agências americanas de contra-espionagem. E seu preparo era exemplar. Nascido numa família modesta (seu pai era um policial), ele tinha freqüentado a Academia Naval e servida como guarda-marinha durante cerca de um ano, até que uma enfermidade o obrigara a sair da Marinha.

Seu gosto pela água salgada o havia tornado inadaptável para a vida civil,  passou meses entregue a um profundo desânimo. Foi então que um oficial da marinha encarregado do pessoal foi visitá-lo e sugeriu que a Marinha poderia ainda ter um lugar para ele se estivesse disposto a servir como agente secreto. Yoshikawa teria que abrir mão de qualquer esperança de promoção; mas isso lhe parecia um preço pequeno a pagar em troca da volta à sua bem-amada Marinha.

As instruções que Yoshikawa recebeu eram simples. Devia especializar-se na Esquadra do Pacífico Americana e suas bases em Guam, Manila e Pearl Harbor; e teria que melhorar seu inglês. Durante os próximos 4 anos, ele permaneceu na Secretaria Americana, estudando Jane's Fighting Ships e Aircraft, devorando livros técnicos, jornais e revistas americanos. Com o tempo, passou a conhecer todos os vasos de guerra e aeronaves americanas pelo nome, número, configuração e características técnicas.

Em fins de 1940, Yoshikawa recebeu instruções para prestar o exame de língua inglesa no Ministério do Exterior, a fim de poder ser nomeado para um posto diplomático, como camuflagem de sua verdadeira missão. Segundo o Almirante Kanji Ogawa, que na ocasião era Chefe-Assistente do Serviço de Informações da Marinha, esse arranjo não era fora do comum. O oficial da marinha era demitido e deliberadamente devolvido à vida civil. Conseguia então um emprego no Ministério dos Negócios Exteriores do Japão e era enviado aonde pudesse render mais serviços à Marinha. Em termos gerais, esse processo coincide com o caso de Yoshikawa: uma discreta insinuação ao corpo médico da Marinha de que o guarda-marinha Yoshikawa seria mais valioso sem uniforme, num período conveniente de desocupação para torná-lo mais receptivo, então...

Em Honolulu, depois de lhe darem um emprego nominal - ele foi oficialmente registrado no Departamento de Estado americano como Chanceler do Consulado - Yoshikawa mergulhou no trabalho. Todos os dias, lia os jornais de Honolulu do princípio ao fim, dando especial atenção às notícias marítimas e às notas sociais sobre o pessoal da Marinha Americana. Um passeio a pé diário pela cidade de Pearl dava-lhe uma visão perfeita da Ilha Ford e de seu campo de pouso. E, 2 ou 3 vezes por semana, ia comer num restaurante de balcão de um velho japonês no cais no final da península da cidade de Pearl. O restaurante ficava diretamente em frente da Ilha Ford, o mais próximo que Yoshikawa podia chegar de Pearl Harbor.

Ali ele podia apurar muita coisa - Ia a esquadra sair em breve? Estava se reabastecendo? - por observação direta. À noite, ia também a bares frequentados por marinheiros americanos, dando-lhes bebidas e ouvindo comentários sobre o serviço, mas raramente fazendo uma pergunta direta para não atrair a atenção sobre a sua pessoa. O medo de ser desmascarado sempre o mantinha alerta, pois a sombra do FBI sempre pairava sobre ele. Kita advertira-o a respeito dessa poderosa organização, e ele receava constantemente que o FBI instalasse aparelhos de gravação no consulado ou em um dos restaurantes que costumava frequentar. Muitas vezes Yoshikawa ia entender-se com Kita tarde da noite, depois do resto do pessoal já ter ido dormir; ele e Kita mantinham suas discussões secretas escrevendo bilhetes um para um outro, depois queimando-os.

Yoshikawa tornou-se uma bonança para os choferes de táxis de Honolulu, tomando-os amiudamente e às vezes trocando várias vezes de carro numa só corrida. Kita não lhe permitia ter um automóvel particular. A licença do carro poderia facilitar sua identificação e pista, e o menor acidente significaria um embaraçoso relatório policial.

O movimento turístico havaiano oferecia a Yoshikawa muitas oportunidades. Até os Estados Unidos embargarem todo o comércio com o Japão, ele ia esperar a chegada de cada navio japonês, reunia um grupo de japoneses queriam desembarcar, e levava os viajantes, que de nada desconfiavam e se mostravam agradavelmente surpreendidos, em passeios turísticos. Certa vez, ele vestiu a sua mais vistosa camisa aloha e levou uma gueixa sua amiga para um voo turístico sobre Oahu, uma excursão que lhe deu uma visão nítida tanto do Campo Wheeler como o Campo Hickam. Investigava os campos de aviação também por mar, às vezes em pescarias, outras vezes nadando.

As plantações de cana de Aiea forneciam a melhor vista possível de Pearl Harbor. Por diversas vezes, Yoshikawa, trajando a indumentária de um lavrador, estudou ali a Esquadra, usando de cada vez uma plantação de cana diferente, e nunca permanecendo ali mais de 30 minutos.

Um dos locais prediletos de Yoshikawa era Shuncho-ro (Restaurante da Primavera), uma casa de chá de estilo japonês no monte Alewa, que comandava uma vista excelente de Pearl Harbor e do Campo Hickam. Às vezes, ele fingia estar demasiado embriagado para ser removido, e a afável direção do Shuncho-ro discretamente levava-o para passar a noite num quarto com vista para o porto.

Numa dessas ocasiões, Yoshikawa viu a Esquadra navegar para fora da barra às primeiras horas da madrugada - uma cena majestosa de emocionar o coração de qualquer marinheiro. Ele observou os navios com intenso interesse profissional, verificando o tempo necessário para a Esquadra deixar o porto, o tipo de manobra empregado e a posição tomada pelos navios. Essa informação era importante para Tóquio, pois se a Esquadra Americana tentasse sair no começo do ataque, os japoneses poderiam modificar seu plano de acordo com essa manobra.

Em 7 de agosto, quando um se realizou no Campo Wheeler um "Dia de Gala" a que o público foi cordialmente convidado, Yoshikawa foi um dos que aceitou pressurosamente o convite. Máquinas fotográficas eram absolutamente proibidas, mas essa proibição não me causou a menor contrariedade. Ele viu tudo, não deixou passar nada, e escreveu suas impressões no momento em que voltou ao Consulado.

Os horários de Yoshikawa eram exaustivos. Feriados não existiam para ele, e o domingo era um dia como qualquer outro. Embora o Japão tivesse outras redes de espionagem no Havaí, Yoshikawa considerava-as, com certa razão, trabalho de amadores.

Estavam os dirigentes americanos cientes de que Pearl Harbour era um alvo em potencial? Certamente! "Se vier a dar-se a guerra com o Japão" - escreveu o Secretário da Marinha Frank Knox ao Secretário da Guerra Henry L. Stimson em 24/01/1941 -, "acredita-se na fácil probabilidade de as hostilidades iniciarem-se com um ataque de surpresa contra a Esquadra ou a Base Naval de Pearl Harbor."

Três dias depois (2 semanas apenas após Yamamoto ter revelado seu o esquema a Onishi), o Embaixador dos Estados Unidos no Japão, Joseph C. Grew, enviou uma mensagem em código ao Departamento de Estado:

“Meu colega peruano ouviu de muitas fontes, inclusive de uma fonte japonesa, que um ataque de surpresa a Pearl Harbor está sendo planejado, no caso de desentendimento entre o Japão e os Estados Unidos. Disse que me estava transmitindo essa informação porque lhe viera de muitos setores, embora o plano parecesse fantástico".

O Departamento de Estado passou a informação - uma das mais importantes da história - à Marinha, que a remeteu ao Almirante Husband E. Kimmel, Comandante-em-Chefe da Esquadra do Pacífico Americana, com este comentário:

 "A Divisão Naval de Informações não dá crédito algum a tais rumores. Com base em dados conhecidos, referentes à atual disposição em atividade das forças japonesas do Exército e da Marinha, nenhuma ação contra Pearl Harbor parece iminente ou planejada para um futuro próximo."

Não obstante, numa carta confidencial da Esquadra do Pacífico, em 15 de fevereiro, Kimmel presumiu que "uma declaração de guerra poderia ser precedida de um ataque de surpresa a navios em Pearl Harbor". Esta suposição foi incluída também em 3 brilhantes e assustadoramente precisos relatórios do Estado-Maior feitos em 1941. O último, um estudo da "Situação Aérea do Havaí", fora preparado pelo Coronel William E. Farthing, comandante do V Grupo de Bombardeiros da Força Aérea Havaiana. Esse documento profético, que foi remetido em 20 de agosto ao Departamento de Guerra, sugeria que o Japão poderia desencadear um ataque surpresa a Pearl Harbor, e que provavelmente utilizaria 6 porta-aviões; e o momento mais propício para despachar um ataque aério desse tipo seria de madrugada; e que o ataque mais provavelmente vivia do Norte.

Para prevenir um ataque, o relatório recomendava entre outras medidas de segurança, que patrulhas aéreas "mantenham uma completa e meticulosa vigilância de 360 ° da área havaiana durante o dia". Para tanto, a Força Aérea Havaiana necessitava de "180 aviões tipo B-17D e de outros bombardeiros de 4 motores de igual raio de ação".

Se planejamento pudesse matar, os japoneses estariam liquidados. Mas a Força Aérea do Exército Americano não possuía 180 fortalezas voadoras. E as que dispunha estavam já sobrecarregadas na defesa das Filipinas, da Grã-Bretanha e da Zona Atlântica, onde a política nacional se concentrara na derrota da Alemanha nazista. Assim, quando os japoneses atacaram, em 7 de dezembro, a forçar aérea tinha apenas 12 B-17 no Havaí.

No verão de 1940, criptologistas americanos decifraram o código diplomático japonês, um dos mais brilhantes cópias nos anais dos serviços de informações. Os informes da espionagem de Yoshikawa e as respostas de Tóquio, todas as remessas de mensagens da e para a Embaixada do Japão em Washington - eram agora abertas aos Estados Unidos. Mas todo esse grande e rico tesouro poderia ter permanecido enterrada, que daria na mesma. Em percepções vitais empilhavam-se por traduzir, às vezes por mais de uma semana. A difusão, o mais decisivo dos requisitos de um serviço de informações, era falha, em parte por pura inércia, em parte devido ao um ansioso zelo de proteger as fontes. Como a difusão poderia levar os japoneses a suspeitar de que seu código havia sido decifrado, frequentemente a informação não chegava às mãos daqueles que mais necessitavam delas. O almirante Kimmel afirma que nunca recebeu nenhuma das chamadas intercepções "mágicas".

No outono, os americanos deram as costas a Pearl Harbor para enfrentar a crise sempre crescente no Atlântico. A Batalha das Rotas Marítimas atingiu o seu clímax em 4 de setembro, quando um submarino alemão torpedeou um destróier americano nas proximidades da Islândia. No tumulto de notícias, o Japão foi relegado às páginas de dentro e não mais recuperou as manchetes até 7 de dezembro. "O Pacífico ainda é a parte mais importante da situação mundial", escreveu Kimmel preocupadamente ao Almirante Harold E. Stark, Chefe das Operações Navais, em 12 de setembro. Mas Stark respondeu traquilizadoramente: "Minha opinião pessoal é que os nipônicos não vão se lançar contra nós".

Essa opinião era generalizada. Com os olhos fixos no Atlântico, os americanos tinham tendência a se esquecer que a porta dos fundos estava aberta.

Em fins de setembro o Comandante Genda começou a treinar os aviadores da I Frota Aérea especificamente para o ataque a Pearl Harbor. A tarefa era tremenda, sobretudo porque a necessidade de sigilo absoluto tornava impossível revelar aos pilotos para o que estavam sendo treinados. Diferentes tipos de aparelhos - bombardeiros de grande altura, aviões-torpedeiros, bombardeiros de mergulho, caças - tinham que ser reunidos em um escalão de ataque capaz de voar em perfeita formação conjunta, não de apenas 50 ou 60 aviões, mas de centenas. Para realizar essa tarefa, o tempo era pouco e ia-se escorando a cada avanço do ponteiro do relógio.

O chefe de uma tal força precisaria de absoluto domínio de sua profissão, paciência ilimitada e qualidades excepcionais liderança. Estava fora de questão escolher esse chefe "pelos números", tirando a sorte entre o pessoal disponível. Mas Genda conhecia o homem exato para a tarefa: o Capitão-de-Corveta Mitsuo Fuchida, seu companheiro de classe na Academia Naval. Aos 39 anos, Fuchida ainda era piloto da ativa (Genda não o era mais). Veterano da guerra na China, com mais de 3000 horas de voo registradas, ele pilotava seu avião como se fosse parte do aparelho e tinha a reputação de ser o oficial mais eficiente da Marinha Japonesa. Quando Genda lhe falou do plano de Pearl Harbor, Fuchida imediatamente se entusiasmou.

Entrementes, o Japão realizou mais uma missão informativa de grande importância. Em setembro, o governo de Tóquio abriu negociações com o fito de conseguir um afrouxamento do embargo dos Estados Unidos à navegação japonesa. Após semanas de discussões entre o embaixador Kichisaburo Nomura e o Secretário de Estado Cordell Hull, ficou combinado que 3 navios de passageiros poderiam partir do Japão para o Havaí e Estados Unidos, desde que não transportassem frete comercial. O governo americano fez essa concessão de boa-fé, acreditando que ajudaria a abrandar as tensões entre os 2 países. O Japão apressou-se em trair essa confiança. Segundo escreveu Sun Tzu, um clássico chinês em assuntos militares muito apreciado no Japão: "Seu inimigo deixa uma porta aberta, deve-se imediatamente entrar".

O Tatuta Maru, primeiro dos 3 vapores japoneses a partir, chegou a Honolulu  em 23 de outubro. Pouco depois do navio atracar, o Consul-Geral Kita subiu a bordo e o capitão entregou-lhe um envelope selado. Era do Estado-Maior Naval pedindo, entre outras solicitações, um mapa pormenorizado com a localização, tamanho e a capacidade de todos os estabelecimentos militares em Oahu. Uma missão especial chegaria em breve para receber o mapa e conferenciar a respeito de outros assuntos importantes de urgência. A comissão consistia do Capitão-de-Corveta Suguru Suzuki, que era uma autoridade no poderio aérea dos Estados Unidos no Pacífico, e do Comandante Toshihide Maejima, especialista em submarinos. Os 2 estavam encarregados de fazer, por si mesmos, uma avaliação das condições de Pearl Harbor e na volta informar pessoalmente o Estado-Maior Naval.

Depois da escala no Havaí, o Tatuta Maru seguiu para os Estados Unidos. O Taiyo Maru, segundo o vapor japonês aprovado pelos Estados Unidos trazia a bordo Suzuki e Maejima, destinava-se apenas ao Havaí. Em Tóquio um porta-voz do governo explicou a correspondentes estrangeiros curiosos que isso era simplesmente uma questão de "conveniência de escala".

O Taiyo Maru partiu de Yokohama em 22 de outubro. Nem o nome de Suzuki nem o nome de Maejima constavam na lista de passageiros; Suzuki figurava como Assistente de Comissário, Maeijima como médico de bordo. Uma vez em mar aberto, o vapor rumou para o Norte e seguiu a rota Norte que a Esquadra de ataque a Pearl Harbor planejava seguir. As condições meteorológicas foram uniformemente boas - em grande parte céus púmbleos o suficiente de neblina para fornecer uma fina cortina, tornando menos visíveis os navios. Só quando o vapor estava a umas 80 milhas ao largo de Oahu é que o primeiro avião de patrulha americano despontou entre as nuvens.

O Taiyo Maru penetrou no porto de Honolulu às 8 horas e 30 minutos na manhã de sábado, 1º. de novembro. A chegada fora cuidadosamente  planejada. Era um fim de semana e aproximadamente a hora do ataque projetado. O vapor ancorou no cais 8, próximo à Torre Aloha, e, da popa, os 2 oficiais podiam, com binóculos, manter o porto em constante observação durante 5 dias. Ambos, Suzuki e Maejima, permaneceram a bordo o tempo todo. Essa havia sido a ordem recebida. O Estado-Maior Naval não queria que nenhum de seus 2 agentes fosse visto ou interrogado por funcionários americanos; e não desejava levantar suspeitas de espécie alguma. O Cônsul-Geral Kita visitou-os 3 vezes ao todo, fazendo-se acompanhar de 2 membros do Consulado para carregar materiais para dentro e para fora do navio. Assim, se a contra-espionagem americana o revistasse, nada seria encontrado em sua pessoa. Se um funcionário subalterno fosse apanhado violando as regulamentações, a explicação seria menos difícil.

Kita não permitiu que o seu principal espião, Yoshikawa, se aproximasse do vapor, na eventualidade de o FBI que estaria seguindo-lhe a pista, porém Suzuki entregou a Kita um longo questionário para Yoshikawa. Entre outras coisas, o Estado-Maior Naval queria saber se Oahu estava de alerta. Poderiam os americanos lançar-se à guerra de um momento para outro? Ou seria possível apanhá-los de supetão? As respostas de Yoshikawa foram favoráveis.

Yoshikawa entregou a Kita o mapa pormenorizado, o longo questionário e todas as suas outras apurações, e um dos auxiliares de Kita subiu displicentemente a escada de bordo com a sua carga preciosa escondida dentro de um jornal local. Houve um suspiro geral de alívio quando a tarefa se completou sem incidentes. O Taiyo Maru rumou de volta ao Japão em 5 de novembro. Os passageiros que embarcaram dele foram submetidos a "uma das inspeções mais minuciosas a serem efetuadas pela alfândega de Honolulu". Nenhum contrabando foi encontrado na bagagem ou na pessoa de nenhum dos passageiros a embarcar.

O ritmo de preparativos ia agora em crescendo. Em 6 de novembro Fuchida realizou um ensaio geral que repetiu o ataque a Pearl Harbor de todas as maneiras possíveis, utilizando um grupo-tarefa de 6 porta-aviões e mais de 350 aviões, e com navios de alvo a 200 milhas do ponto de lançamento dos projéteis, como seria o caso em Oahu.

Quando chegou o momento da partida da esquadra de ataque, foram tomadas minuciosas medidas de segurança para esconder o fato do povo japonês. A fim de atenuar êxodo de tantos porta-aviões, unidades de aviação receberam instruções para efetuar voos sobre as bases aéreas e cidades para que não fosse notada uma súbita ausência de aviões. Todas as unidades do litoral receberam instruções de conceder licenças ao maior número possível de homens, a fim de que muitos marinheiros fossem vistos nas ruas. A própria esquadra deveria viajar com seus rádios em absoluto silêncio. O volume de mensagens e instruções do Japão aumentaria necessariamente, uma vez que a esquadra estivesse a meio caminho, mas a Marinha vinha organizando há várias semanas um falso tráfego, de modo que não se notaria um acréscimo de atividade radiotelegráfica. Tudo estava previsto para dar a impressão de absoluta normalidade.

Ao cair da tarde 17 de novembro, Yamamoto e seus auxiliares subiram a bordo do Akagi, navio capitania de Nagumo, então ancorado na Baía de Saeki para desejar boa sorte aos principais membros da esquadra. O discurso de Yamamoto não se com fosso de habituais frases estereotipadas de encorajamento. Ele disse francamente aos presentes que "Embora o Japão esperasse realizar uma operação de surpresa, todos deviam estar preparados para uma tremenda resistência americana". Em seguida, houve uma festinha de despedida no salão dos oficiais. O ambiente era sério e cheio de dignidade, um pouco pesado mesmo. Mas, durante esse interlúdio, Yamamoto desvendou seu verdadeiro pensamento. "Acredito que essa operação tenha sucesso", disse ele. Por uma tradição ritualística, o almirante em comando em geral expressava apenas esperança no sucesso de uma missão a se realizar. A confiança positiva das palavras de Yamamoto deram grande esperança aos seus ouvintes, ao comerem os simbólicos surume da felicidade e Kachiguri da vitória, bebendo em seguida à batalha próxima, em nome do Imperador: Banzai! Banzai! Banzai!

Ao cair da tarde, o Akagi, com todas as suas luzes apagadas, levantou a âncora e partiu mar afora na companhia silenciosa de 2 destróieres. Grupos semelhantes deixaram outros portos, uns navegando ao longo da costa, outros até 100 milhas ao largo. Ao todo, eram 31 navios - 6 porta-aviões, 2 couraçados, 2 cruzadores pesados, 1 cruzador leve, 3 submarinos, 9 destróiers e 3 grandes navios-tanque. O último a deixar sua base foi o porta-aviões Kaga, que permanecera em Sasebo para reparos.

O local escolhido para o encontro foi a Baía de Hitokappu, um desolado golfo cercado de rochedos escarpados em Etorufu, uma das Kurilas ou ilhas "de fumaça", assim chamadas por causa de sua eterna bruma. A ilha ficava a quase 1.000 milhas ao norte de Tóquio, em mares esparsamente navegados, um esconderijo ideal para piratas nos tempos de bucaneiros. Ali se iniciou a fatídica viagem na cinzenta pré-madrugada de quarta-feira, 26 de novembro. Envoltos nas névoas matutinas como navios-fantasmas, os vasos do grande grupo-tarefa deslizaram para fora de seu ancoradouro.

Uma brilhante, enganosa manobra foi a partida do Tatuta Maru de Yokohama, em 2 de dezembro. Era esse um dos 3 navios de passageiros que o Japão obtivera licença de enviar aos Estados Unidos, e a sua missão presumida de permuta de americanos evacuados do Oriente por nacionais japoneses nos Estados Unidos era plausível e foi profusamente noticiada pela imprensa americana. O Tatuta Maru estava marcado para chegar aos Estados Unidos em 14 de dezembro e, em 3 de dezembro, uma mensagem do correspondente do Times em Tóquio tomou isso "como uma prova de que, por parte do Japão, que era improvável que nada acontecesse por algum tempo". Depois de 7 de dezembro, o Tatuta Maru fez meia-volta e retornou ao Japão.

No sétimo dia de viagem do grupo-tarefa, instruções irradiadas do Japão resolveram pelo menos uma das muitas preocupações de Nagumo. A data era 1 de dezembro a leste da linha internacional de datas (2 de dezembro no Japão, o mesmo dia em que o Tatuta Maru encerrou sua viagem enganosa), e a mesma mensagem dizia: "Escale o Monte Niitaka". Essa era a frase em código anunciando que as negociações tinham fracassado e que agora a guerra era inevitável. Pela primeira vez era fixada a data do ataque: 7 de dezembro.

A Esquadra acabada de atravessar as águas perigosas ao norte da base americana em Midway. A tensão fora grande, pois naquela área a possibilidade da operação ser descoberta por um navio americano ou avião era considerado grande. Milagrosamente, a esquadra passaria desapercebida e foi com alívio e reprimido júbilo que as tripulações se preparavam agora para o combate. O embaixador Nomura e o Enviado Especial Saburo Kurusu receberam instruções para manter as conversações de paz em Washington.

Em 6 de dezembro, todos navios do grupo-tarefa foram totalmente reabastecidos e os navios-tanque (exceto pelos 3 que já tinham voltado para o Japão) foram mandados para um ponto de encontro após o ataque. Pouco depois do meio-dia, as tripulações receberam ordem de comparecer ao convés. Foi ali, então, lido o rescrito de guerra do Imperador, seguindo dessa mensagem de Yamamoto: "O destino do Império depende desta batalha. Que todos sem exceção se esforcem ao máximo".

No Japão, todos os olhos da hierarquia naval estavam agora voltados para  Pearl Harbor. "Havaí, vais cair como um rato numa ratoeira", escreveu em seu diário o Almirante Matome Ugaki, Chefe do Estado-Maior de Yamamoto. "Goza seu sonho de paz por mais um dia" depois, não podendo reprimir sua emoção, acrescentou: "Que coisa tremenda, e jogar assim com o destino de uma nação!"

Às 5 horas e 30 minutos da manhã de 7 de dezembro, os 2 hidroaviões de grande raio de ação, enviados na frente para investigar, foram lançados da catapulta do convés dos cruzadores pesados Chikuma e Tome.  Esses sinistros mensageiros iriam sobrevoar Oahu e o Ancoradouro de Lahaina, ao largo da Ilha de Mauí, para uma última vistoria na Esquadra Americana. Se fossem descobertos, certamente iriam alertar o inimigo. Mas, tratava-se de um risco calculado, em vista da necessidade urgente de informações seguras.

Pouco depois, na semiobscuridade do despontar da madrugada, as emocionadas tripulações de convés aprontaram as pistas de decolagem para dar o sinal de partida à primeira leva de ataque dos "águias selvagens" nipônicos. Quando as equipes se preparavam para entrar em seus aparelhos, cada um dos homens amarrou um hachimaki em redor de seu capacete de couro. O hachimaki é um lenço estreito e comprido que os antigos samurais amarravam na cabeça antes de entrar em combate. Em cada um desses lenços dos aviadores estava agora escrita a palavra Hissho - Vitória Certa.

Quando Fuchida, no porta-aviões Akagi, foi subir no seu bombardeio de empenagem listada de amarelo e vermelho, o oficial superior das unidades de conservação do Akagi entregou-lhe um hachimaki branco, confeccionado especialmente para ele. "É uma oferta da tripulação do Akagi", disse ele. "Gostaríamos que o levasse a Pearl Harbor em nosso nome." Fuchida curvou-se profundamente e amarrou um lenço branco em seu capacete.

Toda a operação de lançamento do ataque foi executado com precisão e rapidez. A primeira leva incluiu 43 caças, 49 bombardeiros de grande altura, 51 bombardeiros de mergulho e 40 aviões-torpedeiros. Apenas quinze minutos depois do primeiro aparelho ter deixado o seu navio-base, todos os 183 aviões estavam no ar. Foi o mais rápido lançamento de que até então se tivera notícia. Acrescentando-se os aparelhos da segunda leva, 353 aviões estariam participando do ataque, a maior concentração de força aérea naval da história bélica daquele tempo.

O sol nascente do Japão imperial nunca se erguera tão alto nos céus e estavam todos conscientes disso. Os tripulantes, alguns com o rosto lavado em lágrimas, ficaram sacudindo seus bonés até os aviões parecerem cabeça de alfinete no horizonte. Também Genda sentiu-se tomado por um intenso orgulho. Com roucos Banzai! ainda ecoando-lhe nos ouvidos, ele desceu à sala de controle do Akagi para esperar a mensagem que seria transmitida quando Fuchida atingisse o objetivo.

Espalhadas pelo Pacífico, a II, III, IV e V Esquadras esperavam também pela mensagem, que as faria se lançarem à batalha em uma dúzia de frentes. Na pátria distante, Yamamoto esperava também, enquanto em Tóquio os oficiais superiores do Estado-Maior Naval se haviam reunido em sombria apreensão no Clube Naval. Lograriam os atacantes surpreender o inimigo? Ou seriam prematuramente descobertos e dizimados?

A primeira informação foi recebida quando um dos 2 aviões batedores relatou aos atacantes o que apurara: os vasos americanos ainda estavam em Pearl Harbor e não havia indício algum de alerta.

Precisamente às 7 horas e 49 minutos, as ondas transmissores se instalaram com a mensagem eletrizante de Fuchida, enviada nos céus havaianos: To-to-to! Era a primeira sílaba da palavra japonesa significando "carga" (totsugeki), significava que a primeira leva estava agora atacando. Mas nada dizia sobre as circunstâncias do ataque.

Poucos minutos depois surgiu outra mensagem a seus superiores a bordo do Akagi e em Tóquio. Fuchida e adiou um tranquilizante Tora, Tora, Tora! (Tigre, tigre, Tigre!). Era a palavra de código combinada para transmitir a notícia de que a surpresa no ataque fora total.


Fonte: 
Segunda Guerra Mundial - Ultra-secreto (Seleções do Reader's Digest - Ed. Ypiranga S.A. - 1963 - impresso no Brasil)



I Frota Aérea da Marinha Imperial Japonesa


A Frota que atacou era composta de:


Força Principal: Vice-Almirante Nagumo
Porta-Aviões:
01 Akagi
02 Kaga
03 Soryu
04 Hiryu
05 Zuikaku
06 Shokaku

Força de Apoio - Vice-Almirante Mikawa
Encouraçados
01 Hiei
02 Kirishima
Cruzadores Pesados
01 Tone
02 Chikuma

Força de Escolta - Capitão de Corveta Omori
Cruzador Leve
01 Abukuma CL



Destróieres

01 Tanikaze

02 Hamakaze

03 Urakaze

04 Kasumi

05 Arare

06 Kagero

07 Shiranuhi

08 Akigumo

09 Isokaze or Asakaze ?

Ataque a Midway
01 Ushio
02 Akebono or Sazanami ?


Navios de suprimentos

Navios-tanques

01 Kyokuto - capitânea

02 Kyokuyo or Akebono ?

03 Kenyo

04 Kokuyo

05 Shinkoku

06 Toho

07 Toei

08 Nippon

Força de Submarinos
3a. Frota de Reconhecimento:
01 I-19
03 I-21
03 I-23
+ diversos subs menores perfazendo cerca de 30 unidades.


 
Trailer do filme que considero o mais completo sobre o ataque a Pearl Harbor em termos históricos: Tora, Tora, Tora! - uma curiosidade: a parte japonesa foi produzida em separado da americana. O projeto original contemplava como diretor da parte japonesa nada mais que Akira Kurosawa, que foi demitido pela Fox Films.

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